A concessão de justiça gratuita é um tema de grande relevância no ordenamento jurídico brasileiro, pois visa garantir o acesso ao Judiciário daqueles que não disponham de recursos financeiros suficientes. Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) deliberou a legitimidade da adoção de critérios objetivos para aferir a hipossuficiência econômica na análise dos pedidos de gratuidade de justiça formulados por pessoas naturais.
Contexto Legal
De acordo com o Código de Processo Civil (CPC), especificamente nos artigos 98 e 99, a pessoa natural ou jurídica que não possui recursos para arcar com os custos processuais tem direito à justiça gratuita. O §3º do artigo 99 estabelece que a declaração de hipossuficiência apresenta pela parte o gozo de presunção de veracidade, podendo ser contestada pela parte correspondente ou pelo magistrado, caso existam elementos que indiquem a capacidade financeira do requerente.
O Debate no STJ
A Corte Especial do STJ iniciou o julgamento de recursos repetitivos (Tema 1.178) para definir se é legítimo a adoção de critérios objetivos na avaliação da hipossuficiência econômica. O relator, ministro Og Fernandes, votou contra o estabelecimento de tais critérios, sublinhando a necessidade de uma análise individualizada de cada caso. Segundo ele, “está vedado o uso de critérios objetivos para o indeferimento imediato da gratuidade judiciária exigida por pessoa natural”
Por outro lado, o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva apresentou uma posição divergente, defendendo que a definição de critérios objetivos para a análise da gratuidade de justiça traz segurança jurídica e eficiência às decisões. Ele propôs que esses critérios sejam utilizados como elementos iniciais, aliados às situações concretas de cada caso, para evitar abusos sem benefício da gratuidade
Implicações Práticas
Na prática, a ausência de critérios objetivos pode levar a decisões discrepantes, uma vez que a análise fica a cargo da subjetividade de cada magistrado. Por outro lado, a adoção de restrições rígidas pode excluir indivíduos que, embora não se enquadrem nos critérios estabelecidos, não possuem condições de arcar com as taxas processuais sem comprometer seu sustento.
Propostas de Critérios Objetivos
Alguns dos objetivos sugeridos incluem:
- Renda Mensal : Estabelecimento de um limite de renda, como três até intervalos mínimos, para presumir a hipossuficiência.
- Benefícios Sociais : Ser beneficiário de programas sociais do governo.
- Representação pela Defensoria Pública : Estar assistido pela Defensoria Pública no processo.
- Isenção de Imposto de Renda : Dispensa de apresentação da declaração de Imposto de Renda.
Esses critérios serviriam como indicativos iniciais, cabendo ao magistrado avaliar as particularidades de cada caso antes de decidir sobre a concessão ou não da justiça gratuita.
Considerações Finais
O debate sobre a adoção de critérios objetivos para a concessão da justiça gratuita é complexo e envolve a ponderação entre a necessidade de uniformidade nas decisões judiciais e a garantia do acesso à justiça. É fundamental que qualquer parâmetro adotado seja flexível ou suficiente para considerar as especificidades de cada caso, garantindo que o benefício alcance aqueles que realmente são relevantes, sem comprometer a eficiência do sistema judiciário.
O processo foi suspenso após pedido de vista da ministra Nancy Andrighi.
Processos: REsp 1.988.686, REsp 1.988.687 e REsp 1.988.697